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Ano da Fé

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domingo, 8 de fevereiro de 2009

A CIÊNCIA DA FÉ E A FÉ NA CIÊNCIA (parte 1/3)

Incomoda-me que as pessoas estejam sempre a falar do divórcio entre Ciência e Religião. Porque nunca o vi. Sempre fui um apaixonado por ciência, mesmo em miúdo, quando explorava enciclopédias só pelo gozo. No entanto, eu também era um miúdo que lia histórias ilustradas da Bíblia só pelo gozo. Um miúdo que frequentava as aulas e a catequese com igual rigor. Um miúdo que tanto fantasiava com Adão e Eva como com dinossáurios. Nunca achei que ambas as posições fossem contraditórias, porque tal questão nem sequer se me afigurou na mente. Tal como nunca se me afigurou que houvesse alguma contradição entre a Matemática e o Português. E a existência de uma tal contradição entre Ciência e Religião nunca se me afiguraria se os teóricos do ateísmo não me tivessem apontado esse facto.

Ora, hoje em dia tenho uma licenciatura numa área científica e a minha posição é… exactamente a mesma! Não vejo e não consigo conceber toda essa oposição entre Fé e Razão que as pessoas parecem forçar no debate da questão. Não consigo! Os meus detractores bem podem dizer que eu tenho a minha mente compartimentalizada… mas a verdade é que ninguém sai do expediente no laboratório com a bata vestida, a fim de analisar a composição do guisado da mamã. Aplicar a Ciência a todos os domínios da nossa Humanidade é absurdo, impraticável e inumano!

Senhoras e senhores, depois de 25 anos de estudos (e sim, até um cérebro fetal “estuda”… é isso que ele faz quando integra estímulos simples na sua rede neural básica), cheguei a uma conclusão fascinante! O Mundo é mágico! Vivemos num Mundo mágico! Uma magia escrita num livro: o primeiro capítulo chama-se Ciência, o último denomina-se Religião.

Por isso, e tentando desfazer os equívocos apresentados pelos ateus, proponho-me a explicar porque não vejo oposição entre Fé e Razão. É minha intenção não ser demasiado prolixo, mas tal é difícil quando se aborda um tema tão complexo. Também devo realçar que, apesar de tudo, ainda sou um noviço e a minha formação ainda é demasiado superficial para o meu gosto… mas penso que será o suficiente para ser bem fundamentada.



Ora bem, um dos maiores trunfos que os ateus têm no debate (e que, geralmente, tira os argumentos aos teístas) é o facto de a Fé não se conseguir explicar. A Fé acredita. A Fé não explica. A Fé é algo que o teísta sente, mas que não é capaz de apresentar de uma forma aliciadora para quem exige provas dela (o que parece ser uma exigência sensata e justa). O teísta encontra-se num círculo vicioso. “Eu tenho Fé porque acredito” e “Eu acredito porque tenho Fé”. Perante este argumento circular, o ateu pensa que ganhou a batalha. Mas nem por isso…

Para já, convém realçar que quem se encontra preso no círculo vicioso não é o teísta, mas o ateu. Mas esse argumento não é meu, pelo que não me irei apropriar dele (e, além disso, é demasiado longo para explanar aqui). Quem quiser conhecer o círculo vicioso do ateu, deve ler o capítulo acerca da loucura d’”A Ortodoxia” de G.K. Chesterton.

Por isso, irei focar-me na forma como o teísta deve resolver o argumento circular da explicação da Fé. Não é muito difícil. É que a Fé é um dos sistemas de estruturação do pensamento.

Existem vários destes sistemas de estruturação do pensamento. A Fé e a Ciência são dois deles. Outros são, por exemplo, a Linguagem (que é o mais importante deles todos; porque além de estruturar o pensamento, a linguagem é fundamental para o próprio pensamento), a História, a Matemática, a Arte, etc… Estes sistemas são muito complexos e permitem explicar vastas porções da realidade. Cada um deles tem um método e apenas consegue explicar a realidade nos termos em que esse método é aplicável. Paradoxalmente, embora estes sistemas sejam ferramentas essenciais para que o Homem possa estruturar a realidade, eles enfermam de um grande defeito… não se estruturam a si mesmos.

O principal exemplo disso é a Linguagem. A linguagem pode referir-se a todo o universo. Quando eu digo: “O universo é belo” eu estou a meter o universo todo numa única frase. Mas a linguagem não pode referir-se a si própria. Já os antigos gregos sabiam que os maiores paradoxos surgem quando a linguagem é auto-referencial. Se eu digo: “Esta frase é verdadeira”, então gera-se um paradoxo. É que essa frase apenas é verdadeira se o seu conteúdo for verdadeiro. Mas esse conteúdo está contingente da veracidade da própria frase. Ou seja, a veracidade desta frase não é verificável. No entanto, a frase existe e foi concebida pela imaginação de um humano. A ideia está lá e pretende transmitir alguma coisa (o que, por si só, é linguagem).

De igual modo, a Ciência não pode ser explicada pelo método científico. Nunca ninguém submeteu o método científico a um ensaio aleatorizado e duplamente cego. Na verdade, fazê-lo seria paradoxal: significaria que estaríamos a usar um dado método para provarmos a veracidade desse próprio método (“Esta frase é verdadeira”, lembram-se?). De igual modo, é paradoxal que os materialistas afirmem que apenas devemos acreditar no que está provado cientificamente, quando não existem provas científicas que validem essa atitude. Significa que os materialistas não podem acreditar em nada, porque nem a Ciência que eles usavam como referência pode ser acreditada. Eles dizem que devemos acreditar apenas na Ciência, mas tal implica “acreditar” na Ciência, sem exigirmos provas científicas dela. Há aqui uma “fé” na Ciência… a Ciência não parece ter de se submeter às provas que ela própria impõe ao resto do universo.

A Linguagem fala, mas não pode falar-se a si própria sem se tornar paradoxal. A Ciência prova pelo método científico, mas não pode provar-se a si própria pelo método científico sem se tornar paradoxal. A Fé acredita, mas não pode acreditar-se em si mesma sem se tornar paradoxal.

É interessante notar que, na supra-citada obra de Chesterton (“A Ortodoxia”), o autor já aponta certas correntes filosóficas (vg: o niilismo) como um “suicídio do pensamento” porque colocavam o pensamento a questionar-se a si mesmo.

Se o meu caro leitor já está confuso, basta pensar no que acontece quando se filma uma televisão e se projecta o filme nessa mesma televisão. Ou quando se colocam dois espelhos frente a frente. Esses fenómenos são paradoxais e desafiam a nossa Razão e, todavia, existem…



Mas o ateu lança a seguinte objecção: “O método científico não precisa de ser submetido ao método científico, porque é a forma mais lógica de explicar a realidade”.

Para isto, basta ao teísta questionar: “O método científico é a forma mais lógica de explicar a realidade? Porquê?”

Geralmente, o ateu não encontrará uma resposta adequada para essa questão, porque nunca se questionou sobre isso. Ele sempre aceitou isso como sendo uma verdade auto-evidente. Pode ser muito divertido vê-lo a responder uma variante do “Porque sim”. Será colocar o ateu na mesma posição embaraçosa em que se encontrava o teísta quando tinha de responder “Porque sim” à Fé.



No entanto, o ateu levantou um ponto muito válido: a Lógica. Penso que a Lógica é o único sistema de estruturação do pensamento capaz de se explicar a si mesmo. E também é a Lógica que explica o método científico no qual assenta a Ciência. A Lógica funciona como uma “ponte” que liga todos os restantes sistemas.

De igual modo, a Lógica pode ser usada para explicar a Fé. É assim que o teísta sai do seu círculo vicioso. O ateu parte do pressuposto (é uma verdade que ele adquiriu dogmaticamente) de que a Fé não tem Lógica. Mas isso não é verdade! Quem quiser ver montanhas de argumentos lógicos para explicar a Fé, pode ler este site aqui:
http://www.peterkreeft.com/



Nessa altura, o ateu vai dizer que, por mais que nós tentemos usar a Lógica para explicar a Fé, a Fé vai sempre obrigar-nos a acreditar em coisas ilógicas. Ora aqui começa a aparecer uma coisa muito engraçada! É que o ateu nunca vai encontrar nada de ilógico na Fé! Porquê? Por causa da Ciência! Exacto! A Ciência vai dar as mãos à Fé, comprovando ao ateu que não existe nada de ilógico na Fé. Porque tudo o que é ilógico na Fé pode ser encontrado na Ciência! Vivemos num Mundo mágico, como eu já disse!

Exemplos de coisas ilógicas em que a Fé nos obriga a acreditar:
1) A Santíssima Trindade (Deus é simultaneamente uno e trino)
2) A Encarnação de Deus (Cristo ser simultaneamente Homem e Deus)
3) A Omnipresença de Deus
4) A Omnisciência de Deus
5) A Eternidade de Deus

Se o ateu considerar estas coisas como ilógicas na Fé, também terá de as considerar ilógicas na Ciência. Não poderá, em nome da coerência interna do seu pensamento, afirmar que um facto é ilógico na Fé, enquanto é lógico na Ciência.

Se o ateu afirma que a Encarnação de Deus ou a Santíssima Trindade são ilógicas, porque uma entidade não pode possuir duas propriedades mutuamente exclusivas…
… como pode o ateu acreditar na Física Quântica, que assenta no postulado segundo o qual o fotão (a partícula de luz) é simultaneamente uma onda e uma partícula?

Se o ateu postula que a Omnipresença divina é ilógica, porque uma entidade não pode ocupar simultaneamente vários pontos no espaço…
… como pode o ateu considerar lógico o electrão, que está simultaneamente em todos os pontos da nuvem electrónica ao mesmo tempo?

Se o ateu assevera que a Omnisciência de Deus é ilógica, porque um ser não pode ter um tão vasto conhecimento de tantas coisas…
… como pode o ateu asseverar que, com as actuais redes de telecomunicações, nós podemos saber quase instantaneamente tudo o que se passa nos locais que a Humanidade já alcançou?

Se o ateu defende que a Eternidade de Deus é ilógica, porque não faz sentido que uma entidade esteja fora do Tempo…
… como pode o ateu defender a Teoria da Relatividade, os buracos negros e tantos outros postulados científicos que demonstram que o Tempo não é algo linear e constante?

De facto, o ateu declara que a Religião faz-nos crer em situações absurdas, sem que ele se aperceba que o Mundo da Ciência é muito mais absurdo do que qualquer religião poderia ser.

(continua...)

6 comentários:

Alma peregrina disse...

Imagem:
"Porträt des Astronomen Nikolaus Kratzer"
("Retrato do astrónomo Nikolaus Kratzer")
Hans Holbein
1528

Canela disse...

Almaaaa...

Não é fácil, chegar aqui e lêr-te!
Mas é possivel!

Quero apenas partilhar:

Fé?! Não se explica. 1º- É dom de Deus! 2º - Como se explica, um sentimento? Não é diferente com a Fé! Como explicar, a quem não conhece Deus, que ELE me ama?

Há que abrir o coração, a esse amor de Deus. Quem tem preconceitos, por achar que religião... é muito "fora de moda", jamais deixará que o seu coração seja tocado, por essa grande Graça (o Amor de Deus).

Sugestão: Rezemos, para que muitos mais, se abram a esta grande Graça, que é o seu encontro pessoal com DEus!

Alma peregrina disse...

Cara Mar com Canela:

Sou plenamente sensível aos seus argumentos, mas é preciso ter em conta que muitas (e boas) pessoas que perdem a fé fazem-no devido ao clima de ateísmo militante que se encontra disfarçado de Ciência.

Penso que é fundamental desconstruir as falácias que parecem colocar a Ciência e a Fé como antagónicas. Primeiro, porque é injusto para com a Fé. Segundo, porque coloca a Ciência a defender um ponto de vista teológico em particular (o ateísmo), quando a Ciência deveria ser espiritualmente neutra. Não suporto esta posição, e achei que deveria reagir contra ela.

Infelizmente (como eu já disse) não sei como explicar estes meus pensamentos sem me tornar demasiado complexo... mas penso que, quando tiver terminado (e para quem tiver paciência de tentar compreender) já terei desconstruído esta falsa luta entre a Fé e a Razão. Deste modo, poderemos voltar a fazer Fé e Ciência sem interferências...

Pax Christi.

Canela disse...

Almaaaaa....

1º Estou de acordo contigo.

2º Quem, se afasta da pessoa que a ama de verdade? Quem não sabe, que é amado.

Deus não me ama mais a mim, do que a "x" ou "y"...

Eu estive afastada da Igreja, vários anos. Quando me afastei, nem dei por isso, quando dei por mim... estava tão longe... que tudo me precia demasiado distante.

O meu regresso, foi uma linda "história de amor", do nosso DEUS, para comigo... mas eu, tive de lhe abrir o meu coração!

Porque me afastei? Embora eu acreditasse, tinha uma grande falta de fé... sabia que Jesus tinha recuscitado... mas onde está que eu não vejo? (um pouco assim)

Quando dei por mim, estava ser carregada nos SEUS braços!

A Paz de Cristo

P.S.: É importante a tua explicação. Mas sem a abertura do coração, é como querer encher um copo com tampa!

joaquim disse...

Meu caro amigo

Tenho de vir aqui com tempo para te ler.

Agora quero agradecer-te o teu interesse pelos meus exames.

Um correu bem, tive tempo de estudar, o outro não consegui estudar porque não me deixaram e foi uma desgraça.

A ver vamos as notas. Depois te direi.

Só agora aqui passo por falat de tempo e porque estive a dar o meu testemunho num programa de televisão.

Abraço amigo em Cristo

Alma peregrina disse...

Cara Canela:

Tem toda a razão... só quero completar o seguinte: por vezes uma pessoa amada afasta-se de quem a ama, não por desconhecimento, mas por orgulho! Para esses, de facto, não há razão que lhes valha. Mas espero que, denunciando esse orgulho, eu possa evitar que outros se percam!

E também instruindo os que se afastaram. Talvez haja por aí uma Mar com Canela que, sendo católica, se afastou... e pode ser que o que eu escrevo a faça questionar-se e voltar a Deus. Enfim, só Deus conhece o Seu Plano Salvífico.




Caro Joaquim:

De nada! Sempre ao dispôr!

:)

Não se stresse antes de saber as notas. Eu acabei de saber a nota daquele exame (lembra-se? aquele que era crucial para a minha vida fuytura?) e que me tinha corrido pessimamente... e afinal correu-me bem (não esplendidamente, mas bem).

E onde deu o seu testemunho? Quero ver!!!


Pax Christi